A cozinha caiçara de Eudes Assis
por Marilu Peretti
SuperChefs SP
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Eudes Assis começou na cozinha aos 15 anos. Nasceu e cresceu no Litoral Norte de São Paulo, mais precisamente na cidade Boiçucanga. Ali aprendeu tudo sobre peixes.
De família humilde e vários irmãos, Eudes teve como inspiração sua mãe, que além de aprender a preparar peixes, cultivou outra culinária, a cozinha local, com o uso de banana e taioba, planta típica da culinária caiçara.
Trabalhou em vários restaurantes da região. Hoje aos 38 anos já rodou vários países e estudou nas melhores escolas de gastronomia. Le Cordon Blue foi uma delas, estagiou em restaurantes da Europa e passou 5 anoscozinhando em um iate onde percorreu 23 países.
Foi eleito em 2010 o chef revelação da revista Prazeres da Mesa e ganhou premio de melhor restaurante de frutos do mar da revista Veja Comer e Beber 2010. Seu nome se consolida entre os grandes da gastronomia mundial, sendo referência em se tratando de cozinha litorânea.
Eudes Assis já cozinhou com grandes nomes da gastronomia internacional como Alain Ducasse, Daniel Boulud e Ferran Adria. Ano passado Eudes Assis participou de um livro de gastronomia com chefs renomados do Michellin, e a foto de seu prato “marmita” participou de uma exposição naGaleria Dupont, em Paris.
Atualmente Eudes Assis é o chef do Restaurante Vinea Alphaville, coordena a oficina de gastronomia no Projeto Buscapé em Boiçucanga, presta consultoria na área da gastronomia, ministra aulas, participa de palestras, jantares e eventos gastronômicos. E leva consigo a bandeira doConfort food, da cozinha de raiz.
O que e quem o inspirou a se tornar um cozinheiro, quais suas primeiras lembranças?
A minha primeira lembrança na arte do forno e fogão de que me lembro, é em casa, com minha mãe preparando pratos da culinária caiçara, utilizando a taioba, muita banana, frutos do mar e peixe seco. Ela foi a primeira cozinheira da minha vida e já praticava a cozinha litorânea que conhecemos hoje. Comecei a trabalhar nos restaurante locais fui me interessando pela elaboração dos pratos que eram servidos e senti vontade de aprender mais e mais.
Qual a maior dificuldade que encontrou no decorrer destes anos?
Quando a gente se propõe a aprender, a realizar algo em outra cidade, a grande dificuldade é você estar longe da família e dos amigos, eu era muito jovem, um caiçara perdido em São Paulo, buscando absorver o máximo de informação. Depois fui para o Exterior e aí a língua e costumes locais também me desafiaram, mas fui em frente. Mas acredite, nada que a vontade de aprender não supere.
Por favor, diga aos nossos internautas quem são seus ídolos?
Alex Atala, Joan Roca, Michel Bras, Joël Robuchon, Alain Ducasse e Ferran Adrià.
Você pode nos contar alguns dos seus segredos sobre a arte de apresentação de pratos?
O segredo da boa apresentação é trabalhar com ingredientes frescos, de qualidade, conseguindo assim um prato bem executado. Os chefs que eu citei acima todos têm um conceito na montagem de pratos de forma muito interessante. Me inspiro acompanhando o trabalho destes chefs, lendo revistas e livros, acompanhando as tendências do food design. E claro, usando sempre o bom senso, como nunca colocar dois carboidratos num mesmo prato, escolher uma proteína, os vegetais que acompanham , o jeito de colocar o molho e as cores dos alimentos.
Qual a sua especialidade, o tipo ou um prato em específico?
Morando no litoral e pela facilidade em comer peixes e frutos do mar me especializei nesta cozinha. Nas minhas viagens ao exterior percebi como os Chefs locais defendem e preservam a culinária de sua região. Por isso hoje eu defendo e divulgo sempre a culinária caiçara.
Quais os ingredientes que mais gosta de trabalhar e que menos gosta?
Posso dizer que deixo fora das minhas receitas todo e qualquer alimento industrializado
Qual seria o roteiro gastronômico dos seus sonhos?
Adoraria ir nos primeiros restaurantes do mundo segundo a revista inglesa The World´s Best Restaurants que lista os 50 melhores e é muito respeitada. Comer no numero 1 do mundo, o El Celler de Can Roca em Girona na Espanha, o Noma em Copenhagem, ter a oportunidade de degustar um prato na Osteria Francescana em Modéna, na Itália, do Chef Massimo Bottura. Voltando pra Espanha em San Sebastian apreciar um jantar no Mugaritz, e viajar pro outro lado do Atlântico, para conhecer o trabalho do Chef Daniel Humm no Eleven Madison Park em NY. O 6o. melhor do mundo, o D.O.M. eu conheço bem! E ainda tem o Arzak, também de San Sebastian, Steirerek em Vienna e Vendôme na Alemanha. Seria realmente um sonho, que eu pretendo realizar!
Qual o seu conselho para aqueles que querem seguir a paixão pela cozinha, mas têm medo de arriscar?
Se você começar dizendo que tem medo de se arriscar, eu vou dizer que a paixão não existe, que você deve seguir outro caminho. É uma profissão para gente ousada, gente que quer o novo, que não tem medo do risco. Logo no início, quando eu passei a ser Chef eu fiz certas combinações, que, apesar de agradar ao paladar dos gourmets, hoje eu não faria. Mas quem está começando tem que se arriscar sem medo! É uma profissão que exige estudo, pesquisa, disciplina, dedicação e se atualizar sempre.
Se você pudesse fazer um jantar para alguém que você admira quem seria e qual seria o cardápio?
Sempre pensei em cozinhar para uma pessoa em particular, um grande ídolo que infelizmente se foi: Nelson Mandela. Já tive a oportunidade de cozinhar para grandes chefs internacionais como na última vinda do ChefAlain Ducasse ao Brasil. Preparei Bolinho de taioba, algo que ele comeu pela primeira vez. Assim como já cozinhei para Alex Atala e Luciano Bosega, gostaria de cozinhar para outros chefs que me deram oportunidade ao longo da minha trajetória, aqui e no exterior, fazendo pratos da cozinha caiçara é claro.
Qual a importância da equipe de cozinheiros e auxiliares em sua cozinha?
Um bom Chef não vive sem pessoas boas ao seu lado, se cerca de profissionais que priorizam o trabalho, sejam comprometidos, façam suas obrigações dentro do tempo esperado. É preciso que todos estejam em sincronia para atender bem o cliente.
Valorizar seus cozinheiros e auxiliares sabendo que cada um contribui para que o trabalho possa fluir, é imprescindível.
Valorizar seus cozinheiros e auxiliares sabendo que cada um contribui para que o trabalho possa fluir, é imprescindível.
Existe uma estratégia para a criação dos menus?
Existe sim, a gente cria o menu conforme a estação do ano, no verão pratos mais frescos e no inverno pratos mais quentes. Procuro trabalhar com a sazonalidade e respeitando a escassez deste e daquele produto que varia nas estações, temos que respeitar, por exemplo, a época do defeso. Hoje em dia eu gosto de fazer o menu com ingredientes que estejam a menos de 100 km de onde estou, valorizo o produto e produtor da minha região, como o pupunha do Sertão do Piavu, o pescado das mãos do pescador na época em que ele é mais farto, a banana da Ilha Barnabé. É atento a isso que o cardápio começa a tomar forma.
Eudes, conte-nos um pouco sobre o Projeto Buscapé
O Buscapé é um projeto social da polícia militar, que oferece várias atividades como música, artes, esportes e gastronomia para 80 crianças e adolescentes entre os dois períodos, manhã e tarde. O intuito é trazer atividades para eles fora do horário escolar, inserir os adolescentes no mercado de trabalho e passar a todos uma boa mensagem de vida, esperança e conquista.
Quais são seus planos para o futuro?
Na verdade já sou extremamente grato pelo que a gastronomia me proporciona. Quero continuar cozinhando, criando e resgatando a cultura e a valorização da cozinha caiçara, dos seus pratos tradicionais, como o azul marinho, e os diversos produtos da terra, para que sejam preparados nos restaurantes do litoral. E também continuar a passar uma boa mensagem no Projeto Buscapé, com ajuda de vários chefes que têm participado, e ainda ter o orgulho de ver essas crianças e adolescentes no mercado de trabalho um dia.
Como você encara essa nova geração de estudantes de gastronomia e qual conselho daria para aqueles que estão começando a carreira na área?
Eu acho que quem escolhe essa profissão tem que ter a certeza do que quer, gostar mesmo de cozinhar e ter o dom, claro. Porque cozinhar é diferente de ter um restaurante, pois para isso você tem que saber administrar, mas para ser chef tem que gostar de estar com as panelas, não tem outro caminho. O trabalho é árduo e requer muita dedicação; por muitas vezes deixamos as famílias em Réveillon, Natal, feriados etc. Ou seja, a realidade, não é o que se vê em mídias e em revistas de gastronomia, isso tudo é uma consequência. Você sai da faculdade um cozinheiro, daí tem toda uma preparação até ter o cargo de chef, para cuidar de uma brigada e assumir um cardápio. É preciso estar disposto a passar por tudo.
Qual mensagem deixaria aos nossos leitores?
Acredite no seu sonho, não importa a profissão que você escolheu. Acredite e vá em busca, com determinação, dedicação e disciplina. Sempre pratique a cordialidade, a gentileza, tenha disposição em aprender sempre mais, no seu dia a dia. Seja feliz e acredite em Deus que você consegue..é meu lema!
Fotos: Luna Garcia e Nicia Guerreiro
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